Boa tarde família! Estes são os conto que falam um pouco da origem do novo campeão de LoL: Ornn!
Você consegue achar as referências?
AS LENDAS PERDIDAS DE ORNN
“Eu nunca vi o deus esquecido. Minha avó me contava estas histórias, mas ela também nunca o viu, nem ela nem a avó dela, nem a avó da avó dela, nem mil gerações para trás. As lendas do deus esquecido só persistem ao redor de fogueiras estalantes e de peixes assados na brasa. Quanto mais nós voltamos no tempo, mais verdadeiras se tornam as histórias.”
As expressões cansadas das crianças se animam de leve. A luz do fogo dança em suas bochechas, mas a dor vive em seus olhos.
“Os deuses vivem entre nós, no céu, entre punhados de terra e além do véu das estrelas. Basta que busquemos a sua graça, que canalizemos a sua existência em nossos corações e ações. No mar, por exemplo, faz tanto frio que nossos olhos podem virar esferas de gelo dentro das órbitas. É verdade, acreditem! Mas quando marinheiros esfregam banha em seus rostos e pensam na Irmã Foca, cujo verdadeiro nome se perdeu no tempo, eles são protegidos contra os gélidos ventos do oceano.
“Outros, como Volibear, recusam-se a permitir que suas próprias lendas esmoreçam, e ainda espreitam este mundo. Ele exige sacrifícios e impõe obediência, é assim que agem os Ursine…”
Todos já ouviram histórias sobre os abomináveis meio-ursos. Com medo, as crianças se aproximam do fogo.
“Ah, sim, pequeninos, mais tarde podemos falar sobre o ursídeo controlador das tormentas, mas quanto menos for dito sobre ele, melhor.”
Como dizia minha avó, depois que se aproximam do fogo, as crianças são todas suas.
“Em vez disso, estas histórias falam do primogênito dos deuses…”
I: A FORMAÇÃO DA TERRA
Ornn era o primogênito entre seus irmãos e irmãs. Ele chegou ao mundo ansioso para lutar. Mas isso não era simples de arranjar. Árvores eram adversários fracos, quebravam-se fácil demais. Icebergs derretiam-se ao seu toque, fugindo para dentro do mar.
Frustrado, ele socou uma montanha. A montanha não cedeu. Ornn se alegrou com isso, e então desafiou a própria terra a uma luta amistosa.
Enquanto Ornn brigava com a terra, ele a amassava e deformava, moldando toda a Freljord que conhecemos hoje. Ele ergueu montanhas de planícies e afundou profundos vales. Quando se cansou, Ornn agradeceu a terra pela gloriosa contenda. A terra respondeu abrindo uma depressão ardente, mostrando-lhe seu próprio coração, e ele foi tomado de honra ao ver um reflexo de si mesmo: um carneiro flamejante. A terra havia julgado Ornn digno e compartilhou com ele seus segredos, conferindo-lhe a força da chama primordial, pois o fogo é o verdadeiro agente da mudança.
Ele contemplou a paisagem resultante de sua luta e assentiu com a cabeça. Seria o bastante. Depois disso, Ornn empenhou-se em construir ferramentas e armas.
Meus ancestrais devem estar sorrindo, pois neste momento uma leve neve começa a cair. Seus flocos tocam gentilmente os capuzes de pelo das crianças e elas esticam a língua para fora.
“Sabia que antigamente não nevava em Freljord?”, Eu pergunto a elas. As crianças parecem confusas. “É verdade. Nossas terras sempre foram as mais frias do mundo, mas nos primórdios do tempo, o ar era perpetuamente seco e cortante, não havia nuvens de tempestade…”
II: A ORIGEM DA NEVE
Foi ainda nos primeiros dias, nos dias frios e sem nuvens, que Ornn construiu uma casa. Ele a fez com a mais nobre madeira. Seu magnífico lar abrangia três vales. Conseguem imaginar? Depois de concluir seu majestoso Salão do Chifre, Ornn avaliou seu trabalho.
“Bom”, ele disse. Estamos falando de um tempo sem linguagem, então aquele foi um grande elogio.
Contudo, sua irmã Anivia estava incomodada. Ornn havia derrubado as árvores em que ela mais gostava de se empoleirar para construir sua casa. Então ela decidiu lhe ensinar uma lição.
Enquanto Ornn dormia, ela entrou voando pela janela de seu quarto e roçou uma de umas penas no nariz dele, fazendo-o espirrar e lançar uma bola de fogo que incendiou os lençóis! Os lençóis então atearam fogo no chão! Anivia entrou em pânico e bateu suas asas para voar para longe, mas isso fez o fogo arder ainda mais forte com o ar seco de Freljord. Sem demora, todo o Salão do Chifre foi tomado pelas chamas.
O incêndio durou dias e encobriu os céus com cinzas. Obviamente, Ornn dormiu durante todo o ocorrido. Ele acordou sobre uma pilha de cinzas e de muito mau humor, já que seu sono havia sido conturbado. Mas ele não sabia o que Anivia tinha feito. E até hoje ela nunca lhe contou a verdade.
“Elogiei meu próprio trabalho e vejam só o que aconteceu”, disse Ornn, vistoriando os danos. “Nunca mais enaltecerei a mim mesmo. Deixarei que a qualidade do trabalho fale por si.”
Ornn tinha um requisito bem claro para sua próxima casa em mente: ela não poderia ser inflamável. Ele criou para si uma pá, uma alavanca e uma forquilha. Com estas ferramentas, ele poderia minerar, mover grandes pilares e comer as deliciosas cerejas em conserva de que tanto gostava.
Ele martelou e moldou pedaços de minério até formar uma negra montanha. Dentro dela havia uma grande forja que canalizava a derretida chama primordial do centro da terra. Ele ficou satisfeito com sua Pedra-Lar, mas o interior dela era quente demais – até mesmo para Ornn.
Então ele cavou um fosso do mar até a montanha. A Irmã Foca permitiu que águas frias percorressem o fosso e resfriassem a Pedra-Lar. Grandes colunas de vapor se ergueram ao céu. Três dias se passaram até a montanha se tornar fria suficiente para Ornn. Durante esse tempo, o oceano que alimentava o rio baixou vários centímetros.
Àquela altura, tanto vapor já tinha subido das águas que o antes perpétuo céu azul estava repleto de nuvens acinzentadas. À medida em que se reuniam e resfriavam, essas novas formas gasosas tornavam-se mais e mais pesadas, até se dispersarem como neve.
E durante cem anos, nevou. E é por isso que até hoje ainda há tanta neve em Freljord.
Uma das crianças franze o cenho para mim. “Se Ornn fez tanto pelo mundo, por que é que só você conhece as histórias dele?”, ela pergunta. A menina é jovem, mas já enfrentou tantas dificuldades na vida que seu cabelo apresenta diversas mechas prateadas.
“Essa pergunta é respondida por uma outra história”, eu digo. “Gostariam de ouvi-la?”
Os ávidos semblantes das crianças dizem tudo.
III: AS TRÊS IRMÃS RECORREM A ORNN
Certa vez, as Três Irmãs precisavam da ajuda de Ornn para salvar seu mundo. Ornn, porém, não ajudava ninguém a salvar mundo algum, onde quer que fosse. Seus motivos eram pessoais e ele não elaborava sobre a questão. Mas isso não impediu as Três Irmãs de viajarem por muitos dias e noites para suplicarem a ele.
“Criaturas de grande e perversa magia ameaçam nossas tribos”, disse a Primeira Irmã. Ferocidade e guerra brilhavam nos olhos dela. “Eles querem destruir tudo que existe e tomar o mundo para si!”
“Parece mesmo um problema”, disse Ornn enquanto continuava forjando sem desviar o olhar.
“Então você lutará conosco? Usará sua força para eliminar os monstros?”
Ornn resmungou. Aquele resmungo significava um “não” que desencorajava qualquer insistência. Todas compreenderam isso. Se tivessem ouvido aquele resmungo, vocês pensariam que a Primeira Irmã foi sábia de se calar.
“Esses seres observam cada movimento nosso”, disse a Segunda Irmã. Esperança e sabedoria soavam em sua voz. “Peço que você pegue a pá com que um dia cavou seu grande rio e use-a para abrir o fosso mais profundo do mundo. Para que assim nós mesmas possamos atrair os monstros ao abismo e resolver nosso problema.”
Ornn resmungou. Aquele resmungo, por sua vez, significava “cavarei o buraco” e ordenava silêncio imediato. Todas compreenderam isso. Se tivessem ouvido aquele resmungo, vocês pensariam que a Segunda Irmã foi sábia de se calar.
Então Ornn cavou um fosso para elas, pois uma grande fenda enriquece qualquer paisagem. Além disso, ele já planejava cavar um de qualquer forma e o local proposto era adequado. Ao terminar o fosso, Ornn deixou as Três Irmãs sem dizer uma única palavra, pois já havia falado demais com elas.
“Como é fundo esse buraco”, disse a Segunda Irmã. “Rezo para que seja fundo o bastante.”
Do abismo recém-aberto soprou um vento uivante e sinistro, como se ele dissesse que sim, era fundo o bastante. Se tivessem ouvido o uivo do abismo, vocês pensariam que elas foram sábias de não descerem para medir a profundidade.
Muitos anos depois, as Três Irmãs retornaram. Sua aparência sugeria que as batalhas contra seus inimigos haviam custado caro.
Naquela vez, a Terceira Irmã falou. Seu hálito gélido recordou Ornn dos dias frios e secos de um tempo muito distante. “Ornn, Construtor de Todas as Coisas”, começou ela.
“Eu não construí todas as coisas”, grunhiu Ornn. Novamente, ele continuou forjando sem desviar o olhar. “Só algumas delas.”
A Terceira Irmã continuou. “Nós voltamos aqui para lhe pedir um simples favor. O fosso que você cavou é tão fundo e largo que não podemos construir uma única ponte sobre ele. Ensine-me a construir uma ponte que jamais quebre e eu mesma farei o trabalho.”
Ornn ergueu uma sobrancelha. Ele estudou os olhos da Terceira Irmã. Ela não lhe parecia de confiança, pois exalava uma fragrância mágica e a magia sempre enfraquece tudo que é resistente. “Há vários construtores de ponte habilidosos. Vão e importunem eles em vez disso.”
“Os outros construtores não são capazes de fazer uma ponte com o tipo de pedra que temos”, respondeu a Terceira Irmã. “Eles dizem que ela caiu do céu e não conseguem forjá-la não importa o quanto se esforcem.” Ela então exibiu um pedaço de metal estelar.
Se tivessem visto o metal estelar, vocês pensariam que era lógico que apenas Ornn seria capaz de moldar aquele material, pois era quase tão inflexível e firme quanto ele. Ornn concordou, mas disse que faria o trabalho sozinho e exigiu o metal estelar como pagamento.
A Terceira Irmã o entregou a ele, e Ornn o usou para forjar uma nova ferramenta que o ajudaria a construir a ponte.
Com aquela ferramenta, e nada mais, Ornn construiu a ponte. A Segunda Irmã se sentiu mal pela mentira da Terceira Irmã, pois elas não precisavam de ponte alguma. Ela perguntou a Ornn que tipo de ferramenta era aquela.
“Eu a usei para martelar”, disse Ornn. “Então a chamarei de ‘Martelo’. Já falei o suficiente.”
Quando ele se afastou para além do alcance dos olhos, a Terceira Irmã percorreu a ponte inteira recitando estranhos mantras. Isso transformou a ponte em uma trave que selou as feras debaixo dela no abismo. Entretanto, Ornn tinha razão, e a adição de magia arruinou a qualidade do seu trabalho. Se as Três Irmãs tivessem deixado a ponte em paz, ela duraria para sempre. Em vez disso, o encantamento proferido lentamente corroeria a construção. O processo levaria eras, contudo, de forma que ninguém fez muito caso, e as Três Irmãs juraram jamais falar sobre Ornn novamente.
Ornn, por sua vez, concluiu que não gostava que as pessoas lhe pedissem favores e arremessou sua pá o mais longe que pôde para oeste. Onde ela caiu, ninguém sabe, e seu destino se perdeu na escuridão.
Então ele se voltou a leste e arremessou sua forquilha favorita o mais longe que pudesse. Ele caiu no Grande Mar. Alguns dizem que, mais tarde, um rei tritão encontrou um poderoso tridente no fundo do mar e que até hoje o utiliza para governar seu reino.
Ornn estava pronto para arremessar seu martelo na direção do céu noturno, mas não conseguiu se forçar a tal e decidiu ficar com ele. Se vocês vissem Ornn e perguntassem a ele qual é a sua ferramenta favorita, ele os repreenderia por pensarem de forma tão infantil. Secretamente, porém, ele favorece o Martelo acima de todas as suas outras criações.
“O amanhecer traz as frutas mais suculentas e os peixes mais carnudos”, eu digo às crianças. “Temos que estar descansados.”
Elas reclamam em coro e imploram por mais uma história. Só mais uma.
“Só há mais uma história sobre Ornn a contar”, eu digo a elas. “Devíamos guardá-la para outra noite…”
Só quando elas juram que farão todas as tarefas sem reclamarem de cansaço é que eu enfim me dou por vencida.
IV: O TROLL E A PORTA DO CARNEIRO
Todos sabem que não se deve desafiar um troll para uma competição de bebida, certo? Até os pequeninos como vocês sabem que não se deve fazer apostas com trolls, pois eles são trapaceiros e sempre vencem. Além disso, todos em Freljord sabem que quanto mais feio for um troll, mais sortudo e astuto ele é.
Infelizmente, Ornn não sabia de nada disso.
Grubgrack, o Horrendo, era o troll mais velho do mundo. Seus pelos do peito eram tão longos que se enroscavam nos dedos retorcidos de seus pés. Eca! Era comum ele tropeçar e quebrar o nariz, que era bulboso e deformado por já ter sido quebrado tantas vezes. Ele tinha só dois dentes bons, um olho ruim e um olho pior ainda. Verrugas e espinhas cobriam sua rotunda barriga. Não vou descrever o cheiro que ele tinha. Se eu o descrevesse, vocês jamais comeriam ensopado de peixe fermentado de novo.
“Construa-me uma porta que proteja meus tesouros contra ladrões para sempre”, disse Grubgrack para Ornn no lado de fora da Pedra-Lar, “e eu lhe darei dez barris de trollmel. É receita de família.”
Ornn mandou sua visita embora, mas Grubgrack meteu o pé na porta para o impedir de fechá-la. Ornn não queria os dedos ossudos do troll estragando a pintura, então deixou a criatura continuar.
“Façamos uma aposta”, disse o medonho troll. “Quem conseguir terminar um barril de trollmel primeiro poderá cobrar uma dívida do outro.”
“Se isso fizer você ir embora, eu aceito.” Ornn nunca tinha perdido uma competição de bebida. Todos sabiam disso naquela época, e agora vocês também sabem.
“Pelo menos vai ser bom beber um pouco”, respondeu Grubgrack, e seu sorriso fez um dos pilares da Pedra-Lar entortar. Enquanto Ornn não estava olhando, o troll colocou um estilhaço de Gelo Verdadeiro no barril e entregou-o ao seu adversário.
Eles brindaram da maneira jovial de Freljord e beberam. Ornn achou o trollmel aguado e não gostou nem um pouco. Grubgrack, porém, já estava na metade do seu barril. Tendo seu barril ainda praticamente cheio, Ornn inclinou a cabeça mais para trás e bebeu até pensar que iria se afogar.
Então Grubgrack bateu seu barril vazio com força no chão e arrotou, fazendo a cor do fogo do forno virar um verde doentio! Ornn tossiu, balbuciante.
“Qual o problema?”, zombou Grubgrack. “Está se engasgando?”
Então, Ornn viu o Gelo Verdadeiro em sua bebida. Ele estava perpetuamente derretendo e aguando o trollmel. Não importava o quanto Ornn bebia, o Gelo Verdadeiro reenchia. Ele destruiu o barril com uma única mão.
“Você trapaceou”, disse Ornn. A fúria de sua voz deu início a um terremoto que afundou algumas ilhas.
“É claro! Que outra vantagem um troll feio como eu teria contra o poderoso Ornn?” Na verdade, os trolls mais horríveis têm quase todas as vantagens do mundo, mas Ornn não passava muito tempo com trolls feios, então não sabia disso. Vocês, pequeninos, agora sabem. “Aposta é aposta”, reforçou Grubgrack.
“Minha palavra vale tanto quanto meu Martelo”, grunhiu Ornn. “Ainda que eu tenha sido tapeado.”
Então Ornn trabalhou durante dez dias e construiu a melhor porta que alguém já havia feito. Ele a adornou com uma cabeça de carneiro, assim como a sua, e também como a do coração de Freljord. Nem magias nem gazuas eram capazes de abri-la. Grubgrack ficou tão impressionado com a qualidade da porta que não soube o que dizer, o que é muito raro para um troll.
Ornn instalou a porta na entrada da caverna do troll, que ficava no topo da montanha do troll e onde todos os trolls mais horríveis da história escondiam seus tesouros.
Com um grunhido, Ornn foi embora, deixando Grubgrack a admirar sua nova porta.
Quando recobrou sua presença de espírito, Grubgrack percebeu que já fazia um dia que ele não contava seu ouro e começou a se angustiar. Só que ele não conseguia abrir a porta de maneira nenhuma! Não havia jeito.
Grubgrack tentou força bruta. A porta com a cara de carneiro não se moveu. Então, ele tentou remover a pintura com seu hálito pútrido. Novamente, a porta não se alterou. Por fim, ele tentou forçar as dobradiças na parede da caverna, mas a porta havia sido fixada na montanha com tanta firmeza que o troll só conseguiu machucar os ombros tentando soltá-las. Ele estava preso do lado de fora.
Grubgrack entrou exasperado na forja de Ornn. “Que brincadeira é essa?”, gritou ele. Seu hálito era tão terrível que quase apagou o fogo da forja.
“Não há brincadeira nenhuma”, respondeu Ornn, reavivando as chamas. “Você me disse para construir uma porta que protegesse seus tesouros de ladrões para sempre, e foi o que fiz. Aquela porta resistirá mais tempo do que a montanha em que está presa. Ninguém pode quebrá-la. Eu a construí exatamente como você pediu.”
“Mas eu não consigo entrar!”, protestou Grubgrack. “E não roubei nada de você!”
“Tempo vale mais do que ouro”, disse Ornn. “Então você é um ladrão, e meu trabalho não abre exceções, assim como minha palavra.”
Grubgrack passou anos tentando entrar na caverna dos seus tesouros, mas a porta nunca se abriu para ele e ele sequer sabia onde ficava a fechadura. A cada tentativa, a porta com a cara de carneiro o encarava, como um lembrete eterno da vez em que ele enganou Ornn.
E se apurarem seus ouvidos, vocês até hoje poderão ouvir os gananciosos lamentos de Grubgrack vindo do topo da montanha antes de cada avalanche.
As crianças dormem profundamente, aconchegadas umas às outras ao redor do fogo. Eu as carrego uma a uma até a tenda dos órfãos. Nossa tribo não tem muito para compartilhar, mas não somos a Garra do Inverno.
A última criança ainda está acordada junto ao fogo. Ele está deitado de lado.
“Essas histórias não são reais”, diz ele com a mais fraca das vozes.
É o garoto sem pernas. Nós o encontramos quase morto depois do nosso próprio vilarejo ter sido saqueado. Não podíamos deixá-lo, eu não podia deixá-lo, então envolvi seus ferimentos em bandagens e o carreguei em meus ombros.
“Acho que elas foram inventadas. Ou… modificadas para nos ajudar a dormir.”
“Uma história é tão real quanto acreditamos que ela seja”, eu digo a ele enquanto sento-me ao seu lado.
“Existe um deus que é bom, mas ele não se importa com a gente.”
Eu balanço lentamente a cabeça. “Entendo por que você pensaria assim, mas isso não é verdade. Tem mais uma história que eu posso contar. Ela foi a última que minha avó me contou antes de eu me tornar adulta. Ela queria que eu estivesse pronta, porque esta é uma história diferente das outras. Mas acho que você já viu o bastante para estar pronto. O que me diz?”
O garoto acena com a cabeça. Eu o aninho no colo e começo.
V: A TRAGÉDIA DO SANGUE DA FORNALHA
Em determinada época, muito antes da divisão de Freljord, Ornn possuía uma legião de ferreiros que viviam no sopé da sua montanha. Eles diziam venerá-lo, mas se alguém perguntasse a Ornn, ele diria que aquilo era um engano e que ele não tinha seguidor nenhum. Ainda assim, a verdade é que eles construíram uma cidadezinha para si mesmos, uma cidadezinha cheia de pessoas que queriam criar as melhores coisas do mundo.
Havia milhares deles. Eles faziam ferramentas. Eles faziam arados. Eles faziam carroças, armaduras e selas. Eles construíram forjas e lares. Eles se chamavam de Sangue da Fornalha, pois jamais sentiam o frio cortante de Freljord e eram capazes de tolerar o intenso calor que fervia sob seus pés descalços nas ladeiras da Pedra-Lar. Eles se tornaram o melhor povo artesão do mundo e suas obras eram superadas em qualidade apenas pelas de Ornn.
Ocasionalmente, ele avaliava o trabalho deles. Se gostava do que alguém do Sangue da Fornalha havia forjado, ele dizia simplesmente “passável”. O que era um grande elogio vindo de Ornn, que muito tempo antes havia aprendido a deixar o trabalho falar por si. Lembra daquela história?
Ornn nunca admitiu que admirava o Sangue da Fornalha, mas no fundo do seu peito, seu coração vulcânico pulsava com grande respeito por aquele povo trabalhador. Eles não se ajoelhavam nem lhe ofereciam sacrifícios de carne. Eles não transformavam as palavras dele em escrituras nem as espalhavam pela terra a povos que não queriam ouvi-las. Ao invés disso, eles se focavam em seu trabalho, silenciosamente. Eles eram imaginativos, engenhosos e esforçados. O Sangue da Fornalha fazia Ornn sorrir, ainda que ninguém soubesse disso pois sua barba escondia seu sorriso.
Um dia, Volibear foi visitar seu irmão Ornn.
Não era uma visita amigável, pois Ornn e seu irmão nunca foram amigos, nem jamais tinham se visitado antes. O grande urso estava para entrar em guerra e precisava de armas para o seu exército. Ornn observou o exército: aberrações ferozes, homens medonhamente transformados em outras formas para agradar Volibear. Eles eram simples, selvagens e se irritavam facilmente.
“Dê espadas e machados a eles”, exigiu Volibear, com intenções perversas. “Dê armaduras a eles e você terá sua recompensa.”
“Não”, disse Ornn, que não queria se envolver com o belicismo de Volibear.
“Está bem”, disse Volibear. “Delegue a tarefa aos seus seguidores, então. Pouco me importa. Apenas faça o que pedi. Eu sou seu irmão.”
Isso enfureceu Ornn de tal maneira que seus grandes chifres reluziram como magma fervente. “As pessoas da cidade no sopé da montanha não me seguem. Elas constroem para si mesmas. São reservadas e trabalhadoras. E isso é tudo.”
Porém, Volibear enxergou por trás das palavras de seu irmão e viu seu ardente coração. Apesar de todas as suas falhas, Volibear era muito bom em ler os outros.
“Elas são um reflexo da sua própria imagem.”
Os chifres de Ornn tornaram-se vermelhos de calor, e então brancos de calor. “Se eu o vir de novo, Volibear, vou surrá-lo até a beira da morte”, grunhiu ele. Se tivesse ouvido aquela ameaça, você pensaria que Volibear seria sábio de ir embora e nunca mais voltar.
Só que Volibear adorava lutar e também não era sábio, então pegou uma peça de armadura das paredes da forja de Ornn.
“Se você se recusa a trabalhar para mim, vou simplesmente tomar o que quero.”
Com isso, Ornn avançou contra Volibear e o acertou com seus chifres. O golpe foi tão forte que o topo da montanha estremeceu.
Aquilo era exatamente o que Volibear queria. Ao longo dos séculos, ele passou a invejar o amor que o Sangue da Fornalha destinava ao seu irmão. Aquilo enfurecia o urso guerreiro.
Sua luta durou oito dias. Eles se enfrentaram com tamanho fervor que o sopé da montanha tremeu. Tão feroz foi o seu confronto que rocha fundida explodiu do cume da Pedra-Lar. Tempestades de raios castigaram a montanha e gêiseres de chamas jorraram dos penhascos. Os céus tingiram-se de preto e vermelho. O sangue do mundo escorreu pelos picos e a terra estremeceu. Pessoas de toda a Freljord viram os resultados da batalha entre Volibear e Ornn.
Quando a fumaça se dissipou, a montanha havia perdido seu cume. Pior do que isso, o Sangue da Fornalha estava morto, sua cidade reduzida a ruínas abrasadas e a uma lembrança tênue.
Por muitos séculos, a meia montanha antes chamada de Pedra-Lar permaneceu em silêncio. De tempos em tempos, uma coluna de fumaça sobe da cratera onde o cume ficava. Alguns dizem ser Ornn, avivando sua forja para impedir que as chamas sob a superfície do mundo se apaguem. Outros dizem que ele está construindo uma grande arma que um dia colocará em uso.
E há ainda outros que acreditam que Ornn foi morto por Volibear, pois ele nunca mais foi visto em Freljord desde então.
“E assim, o nome e as lendas de Ornn perderam-se no tempo e foram removidos dos registros. Essas poucas histórias, transmitidas ao redor de fogueiras crepitantes e de peixes assados na brasa, são tudo o que restou.”
“Essa história é triste, o que significa que é a mais verdadeira”, diz o garoto sem pernas, olhando para mim. Ele tem lágrimas nos olhos. “O que você acha que aconteceu com Ornn?”
“Acho que quando o Grande Construtor voltar”, respondo a ele, “será para remodelar o mundo.”
O garoto ri. “Eu gostaria de ver esse dia chegar.”
“Talvez você veja. Não chore pelo Sangue da Fornalha. Chore, em vez disso, pelas histórias que se perderam na guerra e no tempo, pois elas já foram tão numerosas quanto as estrelas. Repita essas lendas para que os filhos dos nossos filhos ainda possam ouvir a voz dos nossos ancestrais e alimentar o fogo da forja em nossos corações.”
No meu coração, eu sinto o sorriso da minha avó.
Ele me aquece. Não sinto frio sob meus pés descalços.