Prêmio da Música Brasileira anuncia o artista homenageado de sua 31ª edição

Dono de uma voz potente e inconfundível e personalidade extravagante, Tim Maia (1942-1998) marcou seu nome na história da música brasileira como um de seus maiores e mais originais intérpretes e compositores. Para reverenciar seu talento único, o Prêmio da Música Brasileira anuncia o artista como o grande homenageado de sua 31ª edição, em cerimônia marcada para maio de 2024.

José Maurício Machline, criador e realizador do Prêmio da Música Brasileira, destaca sua importância: “A nossa noite de homenagens vai ser uma festa retumbante. Porque a gente vai ter a oportunidade de trazer para o palco a obra de um rei da música soul brasileira, um expoente da música negra no Brasil, de uma relevância imensa, que desbravou um território importantíssimo.”

A empresária Heloisa Guarita, parceira de Machline no Prêmio, faz coro: “Numa época de tantos ‘nãos’ e tudo tão igual, nada melhor que a irreverência e o brilhantismo de Tim Maia. Com certeza será uma grande festa!”.

 

Tim Maia, que já foi laureado 13 vezes pelo PMB, de 1989 até 1998, ganha agora a máxima homenagem da mais importante premiação musical brasileira. Os grandes momentos de sua vida e obra serão dissecados por artistas de diferentes vertentes e gerações, em releituras de seu vasto repertório, sejam composições próprias ou canções que ficaram imortalizadas em sua voz e contagiaram os fãs nos mais de 30 álbuns lançados durante a carreira ou nos palcos do Brasil, como Gostava tanto de vocêO descobridor dos sete maresNão quero dinheiroMe dê motivoDo Leme ao PontalVocêRéu confessoQue belezaLábios de melSossegoAcendo o farolNão vou ficarUm dia de domingoVocê e eu, eu e vocêVale tudo e Velho camarada, entre tantos outros.

Sebastião Rodrigues Maia, que completaria 81 anos em 28 de setembro, cresceu nos anos 1940 e 1950 nas ruas da Tijuca, bairro da Zona Norte do Rio, caçula de 12 irmãos que viviam na pensão de seus pais, Altivo e Maria Imaculada. O talento se manifestou precocemente e aos 8 anos começava a compor. Aos 14, formava sua primeira banda, Os Tijucanos do Ritmo. Um pouco depois, criou o grupo The Sputniks, que contava com Roberto Carlos na formação, e chegou a fazer uma apresentação na TV, levado por Carlos Imperial. Ouvinte de Ângela Maria, Cauby Peixoto, Trio Los Panchos, Os Cariocas, entre outros artista da época, e do emergente rock norte-americano de Elvis Presley, Chuck Berry, Bill Halley e Little Richard, o jovem Tião sonhava com a música e batia ponto na lanchonete Divino, na Tijuca, onde sua turma se reunia, entre eles os garotos Erasmo Carlos e Jorge Ben.

Antes de completar 17 anos, logo após a morte do pai, embarcou para os Estados Unidos sem falar uma palavra de inglês e com 12 dólares no bolso, depois de comprar a passagem com o dinheiro de uma vaquinha que contou com contribuição até do pároco da igreja do bairro. Hospedado inicialmente na casa de uma família amiga no estado de Nova York, foi faxineiro em asilos, baby-sitter, entregador de pizza, operário numa fábrica, ajudante de caixa em supermercado e cozinheiro em lanchonete. Conheceu de perto não só a música americana, mas viu a bossa nova de Tom Jobim e João Gilberto triunfar no histórico show do Carnegie Hall. Montou grupos vocais, fez pequenos shows e se meteu em todo tipo de encrenca. Cinco prisões e quatro anos depois, foi deportado e chegou ao Brasil com a roupa do corpo. Ausente nesses anos, Tim não viu o início do estouro dos amigos Roberto, Erasmo e Jorge Ben, que já tinham músicas nas paradas e faziam sucesso na TV. Roberto e Erasmo ajudaram o amigo gravando músicas de Tim e o indicavam a gravadoras – Roberto gravou Não vou ficar, que fez grande sucesso e marcou uma guinada na carreira do artista, e Erasmo escolheu Não quero nem saber. A grande oportunidade veio logo a seguir, quando Nelson Motta o levou até Elis Regina, que não só escolheu para gravar a música These are the songs, de fase americana de Tim, como fez com ele um dueto para o novo disco, que impulsionaria definitivamente sua carreira musical.

Em 1968 e 1969, conseguiu gravar dois compactos, o primeiro com Meu país e Sentimento, e o segundo com These are the songs e What do you want to bet?. O LP de estreia, que levava seu nome, foi lançado em 1970 e projetou Tim Maia nacionalmente, impulsionado por grandes sucessos como Coroné Antonio Bento, que mesclava, de forma original, o xaxado com o soul. Assim como Padre Cícero, que juntava baião com o soul, Tim passeava com naturalidade por estilos diversos como o funk Jurema e a balada Azul da cor do mar, recebendo o disco de ouro por mais de 200 mil cópias vendidas.

Viveu 55 anos de forma alucinante e intensa. Idolatrado pelos fãs, reverenciado pelos críticos e homenageado por artistas em suas músicas (W/Brasil, Jorge Ben; Eclipse oculto e Podres poderes, Caetano Veloso), o síndico do Brasil acumulou incontáveis sucessos, mas também altos e baixos na carreira. O apetite pela vida e pela música eram tão grandes quanto pela comida, álcool e drogas, o que minou sua saúde ao longo dos anos e lhe rendeu a fama de faltar aos próprios shows, o que acontecia, na maioria das vezes, após noites viradas em festas no camarim comemorando o sucesso da estreia. O único hiato foi durante sua conversão ao Universo em Desencanto, quando se absteve dos excessos e gravou dois discos – Racional Superior I e II – que se tornariam itens de colecionador ao serem renegados e banidos por Tim após se decepcionar com a doutrina.

Tomou as rédeas de sua carreira em todas as áreas: inconformado com os magros percentuais que as gravadoras destinavam aos artistas pelas vendas dos discos e dos royalties das músicas, criou seu próprio selo e editora musical, Seroma, iniciais de seu nome, para que pudesse ter todos os direitos sobre sua obra. Era rigoroso também com sua banda, Vitória Régia, assim como era perfeccionista ao extremo com a qualidade do som nos palcos e gravações, cunhando frases célebres como “mais retorno, mais grave, mais agudo, mais tudo!”.

Tim viveu grandes e conturbados amores e teve três filhos: o adotivo Márcio Leonardo Maia Gomes (Léo Maia), que o músico assumiu sem pestanejar ao reatar com sua primeira e maior paixão, Geisa, que havia engravidado de outro numa das idas e vindas do casal; Carmelo Gomes Maia, também de Geisa, e José Carlos da Silva Nogueira, que Tim reconheceu quando ele já estava com 15 anos, ajudando-o financeiramente e o hospedando em um de seus imóveis. José Carlos foi assassinado aos 36 anos, quando aguardava o resultado do exame de paternidade. Uma história curiosa envolve o filho do meio: em dúvida entre os nomes Carmelo e Telmo, Tim foi ao cartório registrá-lo e na hora optou por Carmelo. Esquecido de qual havia escolhido, sempre chamou o filho de Telmo.

A generosidade com os amigos, o amor pelos animais e a adoração por crianças, com as quais tinha sintonia imediata, eram facetas de sua caleidoscópica personalidade, onde cabia também explosões de raiva e um humor contagiante. Tim Maia era uma figura única e seu legado artístico é um capítulo fundamental e incontornável na história da música brasileira.