Artista sonoro candango vi~nau recria faixa de Geraldo Azevedo em álbum experimental

“Correnteza” decanta composição de 1977 em forma de viagem musical.

O ambiente sertanejo e nostálgico de “Suíte Correnteza”, fonograma de 1977 de Geraldo Azevedo formado pelas canções “Caravana”, “Talismã” e “Barcarola do São Francisco”, é recriado por vi~nau em uma turbulenta viagem sonora. Em seu novo projeto solo, o produtor musical e artista sonoro candango Matheus Vinhal lança “Correnteza”, gravada ao vivo em uma sessão única de improvisação sonora.

Ouça “Correnteza”: www.pirasema.com

Com um trabalho voltado para a música de vanguarda, Vinhal já se apresentou em cidades como Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro. Em sua nova encarnação artística – vi~nau – ele se prepara para uma ousada releitura da MPB com o álbum “Correnteza”, que conta com a participação dos músicos Vitor Wutski (guitarra elétrica), Pedro Keppler (violão acústico), Daniel Penteado (djembé) e Evandro Machado (moringa). Além da produção do disco, vi~nau assina os arranjos de samples, além da concepção e composição dos temas. A banda foi formada por ele em uma residência de arte sonora, exclusivamente para a gravação do disco.

“Sem dúvidas o principal tema da ‘Correnteza’ é a ideia da vida como um fluxo, um rio, em que se navega rumo à foz, à imensidão do mar. Essa temática está presente nas letras das três canções que formam a ‘Suíte Correnteza’, gravada por Geraldo Azevedo. Junto à ideia de fluxo há uma temática nostálgica, manifesta na sonoridade da faixa do Geraldo e que permanece no disco por meio do uso dos samples. E, quando se está na correnteza e aparece uma força que te faz voltar, como a saudade, o que se forma é um turbilhão, o redemunho. Essas duas temáticas, o fluxo e a nostalgia, se complementam e formam a essência dessas composições. Por isso ‘Correnteza’ tem uma sonoridade turbulenta, volumosa, e ainda assim nostálgica, que remete, por exemplo, à vida cigana, ao talismã (objeto de poder místico, ícone de um passado), e à caravana enquanto movimento de eterno retorno”, explica o artista.

Em sua carreira musical, Vinhal é também criador do projeto Cigarras. O coletivo de improviso sonoro de Brasília ganhou destaque internacional através da Wire, importante revista britânica de música e práticas sonoras experimentais, que incluiu uma faixa em destaque na edição de janeiro da publicação. Além disso, o coletivo conta com outra composição na edição mais recente da coletânea Below the Radar, organizada pela revista.

Além das Cigarras, Vinhal também faz parte de outros grupos de improviso sonoro como Escória do Basalto, V ÃO e Muito Nasty, e atua como produtor musical, tendo mixado, por exemplo, o primeiro disco da Escória do Basalto, além de faixas para a canadense Arielle e o jordaniano Omran., com quem assina a faixa de abertura do disco mais recente do cantor de origem palestina, “Shahawand”. Em “Correnteza”, vi~nau decanta os temas e sons presentes na canção original sampleada, atravessando o ambiente sertanejo da música de Geraldo Azevedo em uma viagem sonora que por vezes parece aludir ao movimento dos barcos ou à fluidez de rios e cachoeiras.

“A escolha de um autor sertanejo, vindo do interior, não é fortuita. Sendo eu alguém vindo de Brasília com família do triângulo mineiro, penso no interior como meu lugar. A música sertaneja tem a marca da solidão, uma vontade de encontro. Nesse sentido, às vezes penso na ‘Correnteza’ como uma espécie de música experimental sertaneja. Há em mim ao menos o interesse de se manter numa genealogia musical do interior, que abarca Geraldo Azevedo, Milton Nascimento, mas também Tião Carreiro & Pardinho, Roberta Miranda, ou mesmo Marília Mendonça e Mano Walter”, explica vi~nau.

“Correnteza” foi mixada por Matheus Vinhal e masterizada por Mark Bihler, nos estúdios Calyx, de Berlim, Alemanha. Este é o primeiro lançamento do ano do selo pirasema, voltado para projetos musicais com improviso ou gravações de campo.